Estudos comprovam perda de aprendizagem, aumento do abandono escolar e resistência ao ensino remoto
Com a proposta de sistematizar as principais aprendizagens decorrentes do período mais crítico da pandemia no setor educacional brasileiro, o Dados para um Debate Democrático na Educação (D³e) reuniu um conjunto de evidências sobre o tema. O objetivo é estimular as reflexões sobre os impactos da pandemia na educação e pensar sobre como encaminhar a recomposição das aprendizagens, gerando subsídios para a formulação de políticas públicas baseadas em conhecimento científico.
Parte dos resultados do relatório foram antecipados para o novo governo federal, a fim de subsidiar a equipe nos cem primeiros dias de gestão. Nesse sentido, o D3e elaborou um documento de contribuições para enfrentamento dos problemas decorrentes da pandemia na educação, organizando evidências e conhecimento científico de ponta para a equipe de transição na área de educação.
Impactos da pandemia na educação brasileira
A Nota Técnica “Impactos da pandemia na educação brasileira” é uma realização do D³e e da Fundação Lemann, elaborada por Mariane Koslinski e Tiago Bartholo, pesquisadores do Laboratório de Pesquisa em Oportunidades Educacionais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Com base na revisão da literatura atualizada, nacional e internacional, o documento aponta que houve significativa perda de aprendizado durante a pandemia, que as desigualdades de aprendizado existentes antes da pandemia foram acentuadas, com aumento do abandono escolar e impacto no bem-estar e na saúde mental dos estudantes e profissionais. As análises sugerem um efeito médio equivalente à perda de quatro meses de aprendizagem de crianças que frequentavam o último ano de pré-escolas privadas ou públicas na cidade do Rio de Janeiro (com 5 anos).
A nota técnica também apresenta seis recomendações para gestores públicos, com base nos diagnósticos e programas analisados, para mitigar os efeitos da pandemia já vivenciados no contexto brasileiro e internacional. São elas:
1. Priorização de estratégias e programas de recuperação de aprendizagem com evidências sobre sua eficácia.
2. Foco em crianças mais novas, em fase de alfabetização, e mais vulneráveis.
3. Estruturação de bons programas de busca ativa e de permanência nas escolas.
4. Elaboração e visibilização de programas de acolhimento e de promoção da saúde mental de alunos e profissionais da educação.
5. realização de mais diagnósticos sobre os efeitos da pandemia nas desigualdades de aprendizagem e as taxas de abandono e evasão escolar.
6. monitoramento do impacto dos programas que visam mitigar os efeitos da pandemia.
Vale conhecer
Programas e políticas brasileiras que podem ser considerados referência e servir de inspiração para políticas públicas educacionais
– Programas de acolhimento e saúde mental: Política Estadual de Atenção, Cuidados e Proteção da Saúde Mental implementado em Goiás; Programa V.I.D.A (Secretaria Municipal de Educação de Londrina); Psicólogos Educacionais (Secretaria Estadual da Educação do Ceará) e Programa Saúde Mental na Escola (Secretaria Estadual da Educação de São Paulo).
– Programas para diminuir o abandono e a evasão escolar: Tô Voltando, Meu Lugar é na Escola (Ministério Público de Pernambuco, Prefeitura de Olinda, com as secretarias de Educação, Saúde e Assistência Social); Monitor Busca Ativa (Secretaria de Educação do Ceará); Busca Ativa Escolar (Unicef e Undime); Programa Bolsa do Povo – Ação Estudantes (Rede Estadual de São Paulo); Todo Jovem na Escola (Governo do Estado do Rio Grande do Sul); Poupança Jovem (Rede Estadual de Minas Gerais) e Bolsa de Estudo (Rede Estadual de Goiás).
– Experiências de recomposição e diminuição de desigualdades de aprendizagem: expansão do tempo de instrução; tutoria individual ou em pequenos grupos nos formatos presencial, híbrido ou on-line, com mais efetividade para os seguintes grupos: (i) alunos mais novos na pré-escola ou nos anos iniciais do ensino fundamental (quatro a cinco meses adicionais no aprendizado), se comparadas com o impacto nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio (dois meses adicionais no aprendizado); (ii) alunos com baixo desempenho ou com perfil socioeconômico mais baixo. Projetos Aprender Juntos (Secretaria Estadual de São Paulo) e Tá On (Secretaria Municipal do Rio de Janeiro).
Nota Técnica
Evidências em Mãos (One-page)
Reimaginar e reconstruir: volta às aulas com a equidade no centro
A Tradução de Evidências “Reimaginar e reconstruir: volta às aulas com a equidade no centro” é uma realização do D³e e Itaú Social. O documento apresenta, em língua portuguesa, de forma inédita, o relatório Reimagine and Rebuild: restarting school with equality at the center, publicado originalmente, em abril de 2021, pelo Policy Analysis for California Education (PACE).
Esse relatório parte do princípio de que, mesmo antes do fechamento das escolas, o sistema educacional não atendia plenamente às necessidades dos estudantes. As recomendações apresentadas devem ser adaptadas considerando a realidade complexa e heterogênea do Brasil. Não há um modelo pronto a ser seguido, mas as ideias contidas no material podem inspirar e apoiar gestores brasileiros para que desenvolvam suas próprias políticas.
As recomendações provêm das evidências que surgiram, conjuntamente, de grupos focais com educadores, pais e estudantes; de pesquisas e sondagens com partes interessadas; de uma revisão profunda da literatura e de pesquisas originais a respeito do impacto do coronavírus nas escolas e nos estudantes. São cinco recomendações, a serem implementadas e depois continuadas e ampliadas durante o ano todo: 1. colocar os relacionamentos no centro, 2. atender às necessidades da criança como um todo, 3. fortalecer os profissionais da educação e as parcerias, 4. tornar o ensino e a aprendizagem pertinentes e rigorosos e 5. empoderar as equipes para que reinventem e reconstruam os sistemas educacionais.
Isolamento para todos, educação para poucos
O artigo “Isolamento para todos, educação para poucos: o que a análise das estratégias educacionais no primeiro ano da pandemia nos ensina sobre o acirramento das desigualdades escolares no Brasil” é assinado por Maria Teresa Gonzaga Alves, Valéria Cristina Oliveira e Flavia Pereira Xavier, pesquisadores do Núcleo de Pesquisas em Desigualdades Escolares da Universidade Federal de Minas Gerais (Nupede/UFMG); e por Pedro Araújo Patrício.
O texto apresenta a metodologia desenvolvida especialmente para o Relatório de Política Educacional “Gestão escolar em tempos de crise: o que a pandemia pode nos ensinar para o futuro?”, realização do D³e e Itaú Social, com previsão de lançamento em março de 2023.
O estudo analisa os desafios e as estratégias dos diretores escolares em municípios brasileiros que tiveram uma boa gestão escolar durante a pandemia. O objetivo foi identificar quais aprendizados e reflexões podem ser extraídos desse período em dez municípios, selecionados como estudos de caso a partir de uma metodologia quantitativa.
O artigo, que faz parte das evidências derivadas do relatório, examina a eficácia das estratégias educacionais adotadas no Brasil durante o primeiro ano da pandemia de covid-19, por parte das redes municipais de ensino, a partir da análise dos dados levantados pela pesquisa “Resposta Educacional à Pandemia de Covid-19 no Brasil”, realizada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).