Organizações apontam o financiamento como fator essencial para a promoção da equidade racial

Em julho, o D³e reuniu representantes de diferentes organizações para debater questões relacionadas à equidade racial na educação básica. Um dos pontos principais levantados pelos participantes foi a necessidade de se ter financiamento para promover ações visando à promoção da equidade racial no âmbito da educação básica. Uma formação inicial dos professores e um currículo escolar que incorpore o tema também foram apontados como fundamentais, além do efetivo cumprimento da Lei 10.639/2003, que completou 20 anos em 2023 e tornou o ensino de história e culturas africanas e afrobrasileiras obrigatório nos currículos escolares da educação básica nacional.   

O evento ocorreu no formato híbrido com a participação de organizações da sociedade civil que possuem uma sólida atuação no tema. Cada uma das entidades participantes foram convidadas a fazer um breve relato dos projetos e ações que realizam,  comentar quais abordagens da pauta da equidade racial e educação básica precisam estar no debate público e, por fim, sugerir ações conjuntas para ampliar essa arena de discussão. 

Lara Santos Rocha, assessora de Educação do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT) Equidade Racial e de Gênero, destacou que é preciso olhar para a prática de professores negros, ainda bastante solitária, e que os profissionais que atuam em locais remotos com projetos de combate ao racismo, em geral, não têm apoio da gestão. “Consideramos fundamental também a conexão entre a produção acadêmica e o que de fato ocorre nas escolas”, afirmou. 

Cleo Manhas, assessora política do Inesc – Instituto de Estudos Socioeconômicos, enfatizou, porém, que não bastam ações só no chão da escola e ter estudos com dados e evidências científicas sem haver financiamento. “As escolas que estão bem ganham mais, é meritocrático esse processo”, afirmou. Ela também apontou a ausência de livros didáticos que atendam à Lei 10.639 e de formação adequada para professores. “O MEC deveria liderar um processo de formação docente e de produção de material didático.” Carmela Zigoni, também da área de assessoria política do Inesc, sugeriu como uma possível ação conjunta de incidência a estruturação de uma proposta que promova a consolidação da Lei 10.639, desenhada com base em evidências. 

A proposta foi corroborada por Edmilson Lopes das Neves, diretor da Associação Cultural Bloco Carnavalesco Ilê Aiyê, que enfatizou ainda que a lei surgiu por conta da imposição dos movimentos sociais que já faziam um trabalho nas escolas. “Ela completou 20 anos e não consegue dar o salto que a gente quer. Os professores precisam ter no seu currículo conhecimento de quem é o negro na História do país e na escola não se privilegia a história daquelas comunidades onde ela está inserida”, afirmou. Para ele, as pautas prioritárias dentro do tema da equidade racial são a aplicação efetiva da Lei 10.639, a formação dos educadores negros na sua aplicação e também a produção de indicadores que gerem recursos para a educação.  

Beatriz Benedito, analista de Políticas Públicas do Instituto Alana, relatou que um diagnóstico realizado pela organização mostrou a não implementação da Lei 10.639. “Só 8% das redes têm orçamento para ações voltadas para sua aplicação. As redes não têm orçamento e não há pessoas específicas olhando para isso. Também notamos um número baixo de professores formados para a aplicação da lei”, afirmou. Ela revelou ainda que, segundo o estudo, as secretarias não têm um plano de ação caso haja uma situação de racismo no âmbito escolar.

Verificar o grau de maturidade das redes na implementação da lei é o ponto central de um levantamento que está sendo feito pelo Instituto Dacor, informou Helton Souto Lima, presidente e fundador da organização. “Trazer dados à tona é um compromisso que temos para avançar na pauta de equidade racial na educação. Nascemos a partir da constatação de que ou não temos dados ou os dados estão dispersos e não conseguimos tomar decisões a partir deles”, afirma. Para ele, a lei vai além de uma política de currículo. 

Essa foi a segunda edição do Café com Evidências em 2023, um espaço construído pelo D³e com  o objetivo de trocar experiências de incidência e articulação política sobre temas da Educação. No primeiro encontro do ano, realizado em maio, o tema foi volume de trabalho docente. “Ao reunir diferentes vozes, queremos contribuir para ampliar e qualificar o debate em torno de temas que consideramos importantes para a melhoria da Educação no país”, afirmou Antonio Bara Bresolin, diretor executivo do D³e.