Telma Vinha, pesquisadora da Unicamp, aponta ações para a melhoria do clima e convivência escolar como cruciais para prevenir novos ataques em escolas brasileiras
Para frear o avanço da violência no âmbito escolar são necessários procedimentos e políticas coordenados e complementares entre si e não ações pontuais. É o que recomenda a pesquisadora Telma Vinha, uma das autoras do Relatório de Política Educacional que analisou os ataques cometidos por estudantes e ex-estudantes em escolas brasileiras nos últimos 20 anos. Essa e outras recomendações, além dos principais dados do estudo, foram apresentados em um encontro virtual promovido pela B3 Social que reuniu cerca de 260 organizações de todo o Brasil.
O relatório, lançado no final do ano passado pelo D³e com apoio da B3 Social e Fundação José Luiz Egydio Setúbal, mostra ainda fatores associados ao expressivo aumento desses eventos nos últimos meses – entre 2001 e 2021 ocorreram 15 ataques e entre 2022 e 2023 foram 21 – e que a escola foi entendida como palco de sofrimento, com relatos de situações de bullying, exclusão e/ou humilhação para todos os estudantes e ex-estudantes autores dos ataques. “São eventos trágicos e multifacetados, cujos fatores são múltiplos e inter relacionados. Preconceitos contra grupos sociais minoritários, misoginia, a construção da masculinidade frágil e de conceitos como a supremacia branca, além do crescimento do neonazismo estão entre esses elementos, disseminados em discursos de ódio e pelo terrorismo estocástico”, afirmou a advogada Cléo Garcia, outra autora do relatório presente no encontro.
Também foram mostrados dados de diversos outros estudos sobre o tema, que apontam que a presença de policiais armados não previne ataques violentos e que algumas ações direcionadas às escolas têm caminhado para o aumento da vigilância e do controle. Outros indicam piora na qualidade do clima escolar e que os estudantes negros são os mais abordados e revistados. “Considerando o tipo de pessoas que queremos formar para uma sociedade democrática, plural e cada vez mais complexa, as ações e políticas propostas precisam transformar os discursos de ódio, contribuir para mudar a cultura das violências, e favorecer a construção da convivência democrática e do clima escolar positivo promotor do pertencimento, do cuidado, do bem-estar e da saúde mental”, afirmou Telma.
Para isso, ela orienta a formulação de políticas e programas de convivência proativos ao invés de reativos e a construção de propostas que atuem na ampliação das capacidades coletivas para lidar com tais questões promovendo a mudança de cultura nas escolas e nas redes. Também recomenda a inserção da convivência na escola como componente de formação de base e continuada dos docentes e a garantia de oferta de disciplina ou espaços sistematizados para os estudantes em que questões relacionadas à convivência ética e democrática sejam objetos de discussão.
Após a explanação, foram respondidas perguntas feitas pelas organizações presentes no encontro, muitas delas atuantes diretamente com crianças e adolescentes e que mostraram interesse e preocupação em formas de engajar os profissionais das escolas nas intervenções propostas para colaborar no enfrentamento do problema e com a melhoria da qualidade do clima. Outra questão citada foi a necessidade de expansão e o fortalecimento da rede de atendimento psicossocial, ampliando os serviços de saúde mental e de proteção social básica.